Hacker que ajudou Lula e se aproximou de Bolsonaro volta a prisão.
Quinta-feira, 29 de junho de 2023
Preso pela PF em São Paulo, hacker Walter Delgatti Neto é acusado invadir perfis no Telegram e vazar mensagens de procuradores da Lava-Jato
O hacker Walter Delgatti Neto, que invadiu contas no Telegram e vazou mensagens de procuradores da extinta força-tarefa da Operação Lava Jato em 2019, foi preso pela Polícia Federal (PF) na tarde de terça-feira (27/6), em São Paulo, por descumprir medidas judiciais.
Conhecido como “hacker da Vaza Jato”, Delgatti é suspeito de ter acessado a internet e também mudado de endereço – contrariando ordens da Justiça para mantê-lo em liberdade provisória. A prisão preventiva foi decretada pelo juiz Ricardo Leite, da 10ª Vara Federal de Brasília.
Segundo o advogado Matheus Henrique Moreira, Walter Delgatti foi detido em Campinas, no interior paulista, por volta das 13h. Os endereços que ele havia informado à Justiça, no entanto, eram em Araraquara e Ribeirão Preto, também no interior.
Ele já passou por audiência de custódia, e a defesa deve apresentar um novo pedido de liberdade provisória até quinta-feira (29/6).
Prisão
Walter Delgatti Neto foi preso preventivamente na Operação Spoofing, da Polícia Federal, realizada em julho de 2019, que deteve seis hackers suspeitos de invadirem os celulares de autoridades, como membros do Ministério Público Federal (MPF) do Paraná e do senador Sergio Moro (União-PR), na época ministro da Justiça e Segurança Pública.
Principal alvo da operação, o hacker da Vaza Jato passou a ter direito a responder o processo em liberdade em setembro de 2020, contanto que respeitasse algumas restrições – como deixar de acessar a internet.
Walter Delgatti é réu por interceptação telefônica ilegal e invasão de dispositivo informático.
Na última eleição, o hacker da Vaza Jato também viajou a Brasília, onde se encontrou com o presidente Jair Bolsonaro e com o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto.
Articuladora do encontro, a deputada Carla Zambelli (PL-SP) participou da reunião, realizada na sede do PL, em setembro de 2022.
Lulismo e Bolsonarismo, "os exterminadores da Justiça"
Walter Delgatti Netto, o ‘hacker de Araraquara’, tem uma trajetória marcante no cenário político brasileiro. Além de ser o responsável pela interceptação e posterior entrega de conversas do ex-juiz Sergio Moro e do ex-procurador Deltan Dallagnol, além de outros membros da Lava Jato, ao site The Intercept Brasil – gerando em seguida a série jornalística Vaza Jato –, nos últimos tempos se aproximou da deputada federal bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP) e do próprio ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), tendo tido sua participação ventilada em um eventual plano golpista.
Em um primeiro momento, ainda antes de ter sua identidade revelada, mostrou possíveis relações entre o então juiz Sergio Moro e o então procurador, hoje ex-deputado cassado, Deltan Dallagnol, e outros membros da operação Lava Jato.
As revelações primeiro tiveram o The Intercept na dianteria que, em seguida, incluiu um conjunto de meios de comunicação numa força-tarefa para analisar e publicar os conteúdos. O resultado disso, ao longo do tempo, foi o fato de Moro ter sido declarado suspeito e seus processos da Lava Jato anulados, o que permitiu ao ex-presidiário Lula (PT) concorrer nas últimas eleições. Até aí, Delgatti era uma figura querida, e quase que folclórica, para o campo democrático.
Foi justamente quando começava oficialmente a campanha eleitoral do ano passado, mais precisamente em agosto de 2022, que Delgatti se aproximou do campo bolsonarista. A campanha de Bolsonaro, guiada pelas paranoias conspiratórias do então presidente, procurou Delgatti para saber o que pensava sobre a segurança das urnas eletrônicas. Entre as pessoas com quem Delgatti esteve está Valdemar Costa Neto, presidente nacional do PL. Ele dizia que tinha condições de hackear o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes. A deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), aliada de Bolsonaro, também confirmou ter se encontrado com o hacker.
Ao término de uma entrevista, um internauta perguntou a Walter Delgatti em quem ele iria votar para presidente na eleição daquele ano. “O Walter de hoje, sem dúvidas, vota no Lula, e não só voto, como peço que votem no Lula, faço campanha. Vou apertar 13”, revelou à época.
Menos de duas semanas depois, em 10 de agosto de 2022, é noticiado na Revista Fórum, em matéria de Ivan Longo, que Delgatti teria feito um acerto financeiro com a campanha de Bolsonaro. A notícia, à época, surpreendeu, dadas as declarações de dias antes à própria Fórum.
A matéria diz, apoiada em apuração do jornalista Luis Costa Pinto, que Zambelli e Bolsonaro queriam "colocar Delgatti na equipe paga pelo PL que faria apuração paralela dos votos, espelhando a apuração do TSE". O hacker, inclusive, teria agenda em Brasília com Bolsonaro naquela mesma data para fazer os acertos financeiros.
No mesmo dia, a deputada federal Carla Zambelli divulgou uma foto nas redes sociais ao lado de Delgatti. "28/07, Vilage Inn Ribeirão Preto & Convenções, com as malas na mão. O homem que hackeou 200 autoridades, entre ministros do Executivo e do Judiciário brasileiro. Muita gente deve realmente ficar de cabelo em pé (os que têm) depois desse encontro fortuito. Em breve, novidades", escreveu Zambelli ao postar a foto com Delgatti.
Mais cedo, a imprensa noticiou que a deputada estaria intermediando um encontro entre Delgatti e Bolsonaro para que o hacker trabalhasse na equipe de maketing da campanha do presidente à reeleição. No entanto, horas depois, questionada sobre o encontro, Zambelli enviou um áudio negando que o encontro dela com o ‘hacker de Araraquara’ tivesse relação com a campanha de Bolsonaro.
Segundo a deputada, a foto seria de dia 27 de julho. "Não tem nada a ver com a campanha, nada a ver com o presidente", reforçou, sem esclarecer, contudo, o motivo pelo qual se encontrou com o responsável por divulgar as mensagens de procuradores da Lava Jato que deram origem à série jornalística Vaza Jato.
A aproximação revelou uma mudança de postura não só do hacker como também da deputada, já que em 2019, à época dos vazamentos das mensagens da Lava Jato, ela chegou a compará-lo a Adelio Bispo, o autor da facada em Bolsonaro durante ato de campanha em Juiz de Fora (MG), em 2018.
Dinheiro para atacar urnas eletrônicas
Fotos divulgadas pela revista Veja em 12 de agosto de 2022 revelam que Walter Delgatti Neto realmente se encontrou com Bolsonaro dois dias antes no Palácio do Alvorada desmentindo o áudio de Zambelli. Delgatti foi levado por um Corolla cinza de vidros escuros e placas frias para a reunião fora da agenda, que contava ainda com a presença também da própria Carla Zambelli.
Ao jornalista Reynaldo Turollo Jr., o advogado Ariovaldo Moreira confirmou uma reunião com Zambelli e Valdemar Costa Neto, presidente do PL, na sede do partido em Brasília. Na ocasião, Costa Neto e Zambelli teriam oferecido dinheiro e um contrato na campanha de Bolsonaro para que Delgatti atuasse como "garoto-propaganda" da tese estapafúrdia de Bolsonaro de fraude nas urnas eletrônicas.
“A hora que partiu para essa questão de o Walter afirmar que as urnas podem ser fraudadas aconteceu um mal-estar muito grande. Eu dei opção para o Walter ir embora comigo, disse que isso ia gerar um problema gigantesco para ele, para mim e para várias pessoas. Optei por pegar as minhas coisas e sair”, disse o advogado Moreira à Veja.
Dois dias depois foi revelado que a ideia de Carla Zambelli era que ele fosse contratado como um especialista em ataques cibernéticos pelo Instituto Voto Legal, indicado pelo PL ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para auditar as eleições. A deputada acreditava que os partidos de esquerda não contestariam o trabalho do hacker que revelou a Vaza Jato, e ajudou a dar fim às condenações de Lula. Ou seja: Carla estaria através de uma traição validando o trabalho do Hacker, contra todas autoridades da Lava Jato, operação que fez surgir do anonimato pessoas como a Carla Zambelli.
Carla disse, apenas, que pagou a hospedagem de Delgatti e do advogado Ariovaldo Moreira, no Hotel Phenícia, em Brasília, cujas diárias custam perto de R$ 200. Delgatti foi à reunião com Valdemar para conversar sobre esse trabalho que ele poderia exercer como “fiscalizador das eleições”. Já o assunto do encontro com Bolsonaro não foi revelado.
A parlamentar confirmou que foram tratadas “informações valiosas”, mas se recusou a dizer quais eram: “Isso eu não posso falar”, declarou, segundo reportagem de Eduardo Gonçalves e Patrik Camporez, em O Globo.
Carla afirmou que Moreira, defensor de Delgatti na ação da Operação Spoofing, pediu dinheiro para continuar as negociações. O advogado negou.
“Ele virou para perguntar para mim quanto valia a democracia. Eu falei a ele que a democracia não tinha preço. E ele: ‘Mas eu queria ouvir um valor’”, contou a deputada.
Ela relatou, também, que Moreira ficou “nervosinho” com a recusa, decidiu ir embora e tentou levar Delgatti. Porém, o hacker falou, segundo Carla: “Não, eu vou ficar”. “E aí ele vazou o encontro para a imprensa, porque ele ficou nervosinho e queria dinheiro”, acrescentou a deputada.
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