ARTIGO - Memento Mori
Vander Muniz*
Segunda-feira, 29 de novembro de 2021
Peço desculpas, se você começou lendo o título acreditando que falaria de Harry Potter. Não irei. Hoje não, pelo menos; mas sim: “memento mori” é uma expressão em latim que fez parte da saga em Relíquias da Morte.
No século XVI, a expressão “memento mori” era usada por alguns seguidores de Saint Vincent Paul, santo da França. Canonizado por Clemente XII. Padroeiro das obras de caridade, conforme tradição da Igreja Católica. A frase tinha o objetivo de lembrar-lhes sobre a finitude da vida, da sua mortalidade. Do passar dos anos e do peso que isto carrega. O inevitável envelhecimento. Perder a agilidade da juventude. O desgaste dos músculos e ossos. O enrijecer das veias e o escurecer dos olhos.
Cerca de 3,5 bilhões de anos se passaram desde que os primeiros organismos unicelulares surgiram. Da sopa primordial para cá nos ensinaram que nossa história transcorria entre nascer, envelhecer e morrer. Nenhuma novidade, até então.
Se eu te contar que não é bem assim? Pelo menos, não precisa ser exatamente assim. Se eu te contar que é possível controlar o envelhecimento ou, até mesmo, não envelhecer? Morrer eu não garanto — até vampiros e deuses morrem, quanto mais nós. Pequenos seres formados de átomos que se quebram com uma certa facilidade. Tenho vários ossos que já precisaram de reparos.
Vamos aos fatos. A senescência é o processo metabólico relacionado à passagem do tempo e às mudanças que isso provoca em entidades biológicas. Esse processo está ligado aos nossos telômeros. Não vou me aprofundar e, nessa altura, peço desculpas aos biólogos pela superficialidade, mas o espaço é curto.
Bom, em um grande resumo: se não fosse por esse emaranhado biológico lindo, mas complexo e um pouco falho, não envelheceríamos. Agora entra o ponto importante da história: nem todas as entidades biológicas são assim.
Graças à revolução da tecnologia dentro da genômica, demos saltos enormes na compreensão da nossa constituição. Graças ao big data e a supercomputadores com alta capacidade de processamento, hoje efetuamos análises que antes levariam décadas. Com tudo isso em mãos já avançamos em muitas coisas. Sabemos que células-tronco embrionárias, pluripotentes e células germinativas podem ser “imortais”. São entidades biológicas que não envelhecem. Isso significa que durante o seu processo de reprodução não há perda de informação na replicação. A nova célula criada é idêntica à primária. Existem fungos e bactérias que também não envelhecem. Em São Francisco, na Califórnia, a padaria Boudin fabrica seu famoso pão de sopa usando o mesmo fermento desde 1849. São 172 anos que o fungo está vivo e produzindo. O pão é uma delícia, acredite em mim!
O processo de envelhecimento do corpo é custoso em vários aspectos. Envelhecer é um processo multifatorial, contínuo e complexo. Leva a perda de funções e culmina em agravos e doenças relacionadas à saúde.
Diversos institutos e centros de pesquisa têm colocado esforços em descobrir meios de frear o envelhecimento. Sonham em alcançar a “imortalidade” do homem. A discussão sobre um homem imortal abre debates acalorados e apaixonados para todos os lados. Fiquem tranquilos, não entrarei neles aqui, podemos deixar para depois. É inegável a importância de estudos que propiciam melhor qualidade de vida enquanto envelhecemos. São pesquisas como essas, orquestradas por um mundo enorme de tecnologia, que podem descobrir curas para doenças como Alzheimer, câncer etc.
Caminhamos, sem dúvida, para termos na próxima década o nosso Matusalém — o famoso personagem bíblico que viveu 969 anos. Graças a inteligência artificial, big data, genômica e várias outras inovações, nossos limites de vida foram ampliados. Nem as ficções científicas mais clássicas pensavam nisto. Em Fundação, cânone de Isaac Asimov, Hari Seldon — um dos personagens importantes da trama, morre, idoso, com 81 anos. A galáxia foi dominada, mas se morria aos 80 anos. Pensar na vida acima disso, em plena atividade e saudável, é uma barreira mental que superaremos na próxima década. A física, é só esperar fazer oitenta para me contar.
Já me preparando para isso, comprei um jogo de dominó. Estou treinando para não passar vergonha na pracinha daqui a noventa anos. Nos veremos lá?
*Vander Muniz é curioso, Executivo de Tecnologia, Empresário e Estudante. Por acidente foi trabalhar na área da Computação se especializando em Inteligência de Negócios baseado em Dados e em tecnologias como Inteligência Artificial e Big Data. Formado em Ciência da Computação, especializado em Neurociência, Bioinformática e Inovação. Hoje atua na área de desenvolvimento de soluções com tecnologias disruptivas em diversas empresas.
Nenhum comentário