Médica referência no atendimento aos pacientes com covid-19, revela os mitos e verdades sobre o novo coronavírus

Revelações importantes como Reinfecção, efeitos de medicamentos como Ivermectina, Cloroquina, Hidroxicloroquina e Azitromicina


 Terça-feira, 09 de fevereiro de 2021 

Em tempos difíceis enfrentados com a pandemia, quando a chegada das vacinas ao Brasil tem sido um alívio, a reportagem entrevistou a médica Ludhmila Hajjar, dona de um extenso curriculum da medicina, nome que é referência nacional no tratamento do novo coronavírus. 

  • Cardiologista intensivista da Rede D’Or, 
  • Professora associada da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), 
  • Coordenadora de Cardio-Oncologia do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da FMUSP 
  • Coordenadora de Cardiologia do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP) 
  • Diretora de Ciência e Inovação da Sociedade Brasileira de Cardiologia 

Ludhmila Hajjar tirou dúvidas importantes sobre esse vírus tão mortal, como você pode conferir a seguir:


Quem já teve covid-19 está arriscado a pegar novamente?

Quem teve na maioria das vezes desenvolve uma forma de imunidade, mas a duração é individual. Há quem fique um mês, dois meses, seis meses, não temos como prever e saber qual a duração e intensidade dessa imunidade. Muitas vezes a pessoa está imune a uma variante do vírus, e hoje vemos variantes e mutações. O que estamos vendo hoje na prática clínica e no dia a dia, são muitos casos de reinfecção. Uma vez que a pessoa teve, um mês após a doença a recomendação é tomar a vacina. Pois não reconhecemos que uma vez a pessoa tendo tido a doença, ela estará com uma imunidade definitiva. Há reinfecção e esse é um motivo de preocupação. Nós devemos manter todas as medidas de prevenção, mesmo aqueles que já tiveram a covid-19.


Quantos casos de reinfecção a senhora já atendeu?

Já atendi em torno de 50 casos de reinfecção e reitero que, esse último mês com muitas pessoas vindo do Norte do Brasil, principalmente de Manaus, vimos muitos casos de reinfecção, e reinfecção confirmada. Com o primeiro caso com teste positivo, com tomografia alterada, com diagnóstico clínico e agora novamente. Ou seja, a reinfecção é um problema, ela faz parte do dia a dia dessa pandemia e todos nós precisamos redobrar os cuidados.


O que houve de fato em Manaus, uma das primeiras cidades no Brasil onde o vírus se alastrou. A cidade em tese já não estaria imunizada?

Manaus podemos dividir em duas partes. Primeiro como a cidade se comportou no início da pandemia. Lembrando que Manaus foi uma das primeiras cidades afetadas e de maneira dramática. Uma das explicações é o fato de Manaus receber muitos agentes internacionais. Tendo uma carga de viagens aéreas muito grande. Ao mesmo tempo, muitas pessoas moram em situações precárias, como a população ribeirinha e os indígenas. Depois, a doença teve uma queda nos meses de setembro e outubro do ano passado e considerou-se que estaria controlada. Saiu até um estudo dizendo que cerca de 70% da população estaria imunizada. Infelizmente houve um relaxamento das medidas protetoras, como o distanciamento social. Houve uma quebra de todas as recomendações e o retorno às aglomerações. Infelizmente veio a recorrência da covid-19. Um novo pico da mesma doença e o surgimento de novas variantes, que se dá quando a população está imunizada contra variante inicial e isso faz com que o organismo permita o supercrescimento de outras formas virais. E hoje, lamentavelmente, Manaus vive um caos pelo recrudescimento da pandemia, pela nova cepa e por uma mudança epidemiológica que mostrou que tem uma população mais jovem aparentemente mais grave, com uma cepa mais infectiva e transmissível. Isso serve de exemplo para o resto do país, uma vez que não temos o controle da pandemia.


Sobre a vacina, existe uma mais eficaz que a outra, ou todas são importantes?

O que eu gostaria de chamar a atenção para esse assunto é o fato de que, em menos de um ano da pandemia, temos uma vacina eficiente, e é realmente fruto de um avanço científico grande. É motivo de estarmos muito felizes como população e como vítimas de uma doença tão grave. Então nós temos mais de uma vacina, e o melhor é termos elas disponíveis. Há diferença entre as vacinas, sem dúvida, como há diferença quando olhamos várias medicações para hipertensão arterial e diabetes. O que importa é ter a vacina, o que importa é a vacina chegar até a população. A gente brinca que vacina boa é aquela que chega ao nosso braço. Eu por exemplo tomei a primeira vacina disponível, como profissional da saúde e como pessoa de risco. Então as pessoas não precisam se preocupar com isso. Até porque por trás dessas liberações existem órgãos extremamente sérios, no caso do Brasil a Anvisa, que farão todas as avaliações criteriosas para afirmar que estas vacinas estão disponíveis. Então a ideia é estar disponível para tomar a vacina. Podemos confiar em nosso órgão regulatório e devemos tomar a vacina que estiver disponível no momento.


E as pessoas que estão se automedicando com a Ivermectina? E a Cloroquina e Hidroxicloroquina fazem efeito? Quem tem covid-19 é aconselhável tomar?

Infelizmente a automedicação é um problema na covid-19. O que aconteceu é que essa pandemia afetou todo o mundo, deixando as pessoas muito inseguras e com toda a razão. Nós não tínhamos medicação, não conhecíamos a doença e vimos várias pessoas sofrerem e perderem as suas vidas. Então, muitas tentativas foram feitas. A questão desses remédios, bem como a Azitromicina, que considero que estão na mesma linha de raciocínio, é que existiram alguns estudos muito iniciais e experimentais na maioria das vezes, e que sugeriam que essas medicações pudessem inibir o vírus, inibir a multiplicação viral. Em março e abril, quando a pandemia começou a disseminar no mundo, começou-se a utilizar esses medicamentos mesmo antes de estudos confirmatórios que pudessem comprovar a real eficácia e segurança. É até compreensível que em março e abril, quando não tínhamos conhecimento sobre a doença, que as pessoas utilizassem e os médicos prescrevessem. O fato é que agora, um ano após o início da pandemia, a ciência teve tempo suficiente para testar essas medicações. Hoje eu respondo claramente que a Ivermectina, Cloroquina, Hidroxicloroquina e Azitromicina não têm nenhum papel, nem na prevenção e nem no tratamento da covid-19. E todos têm efeitos colaterais sérios. O que pedimos para a população é para não se automedicar, é para procurar assistência médica. E também estamos trabalhando para a conscientização dos profissionais da saúde, que sigam as recomendações das agências regulatórias internacionais, que já confirmaram para o mundo a ausência de benefício dessas medicações para a covid-19.


Quem já teve covid-19 e ficou posteriormente com fadiga ou alguma outra pequena sequela, e quem teve e não sentiu nada é indicado fazer um exame apurado pós-covid ou um check-up?

Não há dúvida que hoje nós aprendemos que a covid-19 não é só uma doença do pulmão, ou só do sistema respiratório. Infelizmente ela é uma doença sistêmica, que pode afetar o sistema cardiovascular, o coração, o cérebro, gerando alterações agudas, alterações crônicas, distúrbios do sono. Problemas musculares, articulares e fadiga. São várias as manifestações dessa doença. Não é para as pessoas ficarem em pânico. É para elas se cuidarem e entenderem que o cuidado médico não termina quando a pessoa se diz curada da doença. E sim, é válido que essa pessoa seja acompanhada por um período mais longo. Uma avaliação bem mais completa e segura.


A pandemia também fez com que as pessoas relaxassem mais no cuidado com a saúde em outras áreas. É verdade?

Nesse período de pandemia, o brasileiro deixou de cuidar do seu coração, do diabetes, deixou de fazer atividade física. Parou de ser atendido, ele passou a ficar mais em casa, passou a comer errado. Os hábitos pioraram e as doenças cardíacas aumentaram muito. No Brasil a mortalidade do coração aumentou 132% no ano de 2020. A incidência de morte súbita cardíaca aumentou 30%. Temos que modificar esse cenário entrando 2021 com uma estratégia de cuidados não só da covid-19 mas de todas as suas consequências, que são diretas pela doença e indiretas por afetar todos o sistema de saúde, a economia e a sociedade de um modo geral. Temos que olhar para isso de uma maneira integrada.






Digoreste News, com Jornal de Brasilia 

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