CNPG se posiciona sobre decisão que suspende investigações e ações penais baseadas em relatórios do COAF
Ao suspender investigações e ações penais, pode alcançar incontável número de processos, em todo o território nacional, destinados à apuração de crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e organização criminosa.
20 de Julho de 2019 - 10:14
O Conselho Nacional de Procuradores-gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG) emitiu Nota Pública nesta quinta-feira (18) sobre a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, que suspende investigações e ações penais baseadas em Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) produzidos pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).
Confira abaixo o documento:
NOTA PÚBLICA
O Conselho Nacional de Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG) vem manifestar sua grave preocupação com decisão proferida pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) que, ao suspender investigações e ações penais baseadas em Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) produzidos pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), pode alcançar incontável número de processos, em todo o território nacional, destinados à apuração de crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e organização criminosa.
A complexidade dos delitos praticados por organizações criminosas e dos atos de lavagem de dinheiro exigiu o desenvolvimento de políticas internacionais de combate mais sofisticadas, com a estruturação, em cada país, de um sistema de inteligência capaz de monitorar informações, agrupar dados e gerar relatórios precisos sobre a movimentação de recursos, operado por equipes qualificadas para a gestão do conhecimento e para o desenvolvimento de estratégias de localização e averiguação dos fluxos financeiros.
Diversos tratados e convenções internacionais recomendam que cada país institua unidades de inteligência financeira para sistematizar informações sobre movimentações atípicas de capital e aprimorar o intercâmbio de dados.
Por sua vez, a legislação brasileira determina às instituições financeiras e outras entidades assemelhadas a elaboração de relatórios das operações que, por suas características, valores, forma de realização, instrumentos utilizados, ou pela falta de fundamento econômico ou legal, possam configurar indícios de crimes, bem como o registro de toda transação acima de determinados valores.
O formato desses relatórios financeiros, em geral, contém informações mais detalhadas do que a mera indicação dos montantes globais dos recursos movimentados e da respectiva titularidade, de modo que a decisão proferida cria exceção que não existe na prática forense. E todos esses dados devem ser encaminhados ao COAF, que, por imperativo legal, tem o dever de reportá-los diretamente ao Ministério Público.
A propósito, decisões do próprio STF têm conferido validade à atuação do COAF e do Ministério público na prática de intercâmbio de dados de inteligência financeira nos moldes delineados pela legislação (cf. STF, RE nº 1.066.844/SP, 1ª Turma, rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 12/12/20-17).
No âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ), também se pacificou o entendimento segundo o qual os relatórios financeiros encaminhados pelo COAF ao Ministério Público com aquele conteúdo podem ensejar posteriores medidas judiciais (HC nº 349.945, 6ª Turma, rel. Min. Nefi Cordeiro, rel. p/ acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 6/12/2016).
É preciso considerar que, nas mais das vezes, o RIF constitui indício inseparável de outros elementos no contexto probatório, de modo que a decisão ora proferida tem o efeito de suspender indiscriminadamente investigações e ações penais em curso no país nas quais aqueles dados Nem sequer tenham sido avaliados pelos órgãos de investigação.
É relevante considera, ainda, que quase todas as investigações e açõEs penais que envolvem delitos dessa natureza não raro são instruídas com dados oriundos do COAF no modelo até então vigente, o que significa dizer que a paralisação atinge praticamente todas as investigações e ações penais que tenham por objetivo aqueles tipos de crimes.
Na perspectiva de permitir a continuidade do trabalho investigativo do Ministério Público brasileiro com a desejável estabilidade proporcionada pela legislação e pela jurisprudência sedimentada nos Tribunais Superiores, o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais espera que a decisão seja revista com a celeridade que a matéria exige.
Brasília, 18 de julho de 2019.
Paulo Cezar dos Passos
Procurador-Geral de Justiça do MPMS
Presidente do CNPG
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